domingo, 31 de maio de 2009

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Analisando tudo que havia se passado, agora ele estava mais calmo. Trancado em seu mundo, seu quarto, conseguia só agora admitir que o diferente era ele. Não poderia obrigar as pessoas a serem como ele, pois pessoas eram pessoas e consequentemente eram diferentes. O grande conflito que permeava sua mente era o motivo da maioria não ser assim, mas exatamente o contrário. Ninguém se interessava pelo que ele se interessava, e vice-versa. Não tinha muitos amigos com que pudesse conversar sobre seus temas preferidos. Um livro lido, um gibi de Alan Moore, um filme de Aronofsky, enfim... Ele era Nerd. E, como todo bom Nerd, era incompreendido. Ninguém queria saber a profundidade de Matrix e a maioria achava O Senhor dos Anéis um saco. Quase todos sabiam sobre a novela ou que estava acontecendo nos reality shows, menos ele. E todos amavam falar da vida dos outros, claro. Completamente deslocado nas conversas, se refugiava no seu quarto, achando que ora ele era especial ora um idiota. Não é muito fácil ser assim, nem tampouco agradável. As coisas que lhe davam prazer era o conhecimento, e isso às vezes se tornava um vício. Queria saber mais e mais e a frustração de não conseguir chegar perto do que queria e nem da capacidade de sua memória faziam um buraco em seu estômago e uma angústia incurável. A ansiedade costumava andar com ele direto. O que mais ficava em sua cabeça eram o Por quê e o Como. Não se conformava com os "porque sim" da vida e desde sempre procurava buscar os motivos. Coisa que só ele fazia da sua turma, e assim foi desde sempre. Hoje, mais maduro, entende que a vida é simples, e as complicações servem para confundir e aumentar a angústia. Conseguia entender a música de Lobão, que diz “A maior expressão da angústia pode ser a depressão, algo que você pressente. Indefinível, mas não tente se matar, pelo menos essa noite não.” Aos poucos, foi percebendo que podia ser diferente, porque não que todos fossem imbecis, mas todos eram diferentes. Chegou a duvidar de John Donne, e talvez cada homem fosse sim uma ilha. A humildade é a chave da sabedoria, e assim quis buscar o máximo que pudesse. Sabia que existia algo maior, algo além de sua capacidade de entendimento. Algo que preenchesse o espaço vazio dos motivos e razões que questionava. Existia algo simples. Simples como E=mc2. Simples que poderia sentir-se bem com o pouco. Sentir-se completo. Existia um entendimento que a chave era o amor ao próximo. Tinha lido algumas coisas e embora não acreditasse na veracidade daquilo, foi lendo mais e mais. Entendeu certa vez quando viu nos olhos do cidadão no frio, o qual ele trazia a blusa de lã, que ali estava a resposta de tudo. Ali, naquela porta de padaria fechada, de noite, no frio, aquele Zé Ninguém tremendo recebeu de graça algo para lhe aquecer, que para quem deu não era nada, porém para o moço era tudo. Existia algo então que preenchia o vazio. E percebeu que mais complicações existiam naquele tema. Se todos já não queriam saber de Matrix, imagina desse assunto. Era simples, mas todos complicavam demais. Faziam dos ensinamentos escritos há muitos anos uma verdadeira zona. Ninguém se entendia. Todos estavam preocupados em rebater acusações, em apontar castigos, em julgar. Organizações preocupadas com lucros. Porém, ele tinha esperança ainda que tanto os que sabiam muito quanto os que não queriam saber um dia pudessem entender o que ele viu naquela noite. A noite que abriu seus olhos para Deus.