sábado, 26 de junho de 2010

A busca pela Lógica

Possuímos um desejo perene que é a busca pela verdade. Normalmente não nos satisfazemos com algumas coisas e mesmo pequenos, na escola, refutamos ideias como: Por que tenho que ir para a escola? Por que preciso aprender Matemática? E assim por diante. Questionamos, ouvimos as respostas que nos são dadas, acreditamos ou não, nos conformamos ou não, e seguimos adiante, em busca do próximo passo, ou próximo nível. Mas, para Bertrand Russell a coisa não foi bem assim. Desde pequeno, ele era um menino curioso, que questionava as ordens de sua avó e se tornou posteriormente um grande filósofo matemático. No gibi chamado Logicomix nos é apresentado a vida de Bertrand Russell contada por dois filósofos gregos chamados Apostolos Doxiadis e Christos H. Papadimitriou. Sem dúvida nenhuma esse trabalho, além de muito interessante, é uma obra de arte. Utilizar o gibi para discorrer sobre um assunto indigesto que é a matemática, especialmente a lógica, e a vida de um matemático poderia matar qualquer um de tédio, mas não é o que acontece nesse caso. O livro-gibi é extremamente divertido, e muito intrigante. Confesso que não conhecia a obra de Russell, e fiquei espantado com a angústia desse homem que queria a todo custo questionar os axiomas matemáticos mais básicos, como Euclides por exemplo, e iniciou uma obra para provar a fundação lógica de toda a matemática.

O que chamou a atenção do mundo e tirou Russell do anonimato foi seu paradoxo, conhecido como paradoxo de Russell que prova, por meio de um questionamento, que a teoria dos conjuntos de Georg Cantor e Gottlob Frenge é contraditória. Poderia um conjunto de todos os conjuntos os quais não contém a si próprios conter ele mesmo? Se sim, então não pode. Se não, então pode. [1] Isso gera um paradoxo, como o paradoxo do barbeiro, de Kurt Godel e o paradoxo da enciclopédia. Seria como disse Euboulides: "Caros cidadãos, estou agora mentindo para vocês." Se ele está dizendo a verdade, então está mentindo. Se está mentindo, então está dizendo a verdade.

Uma das coisas que me chamaram a atenção na obra é que Russell foi procurar Cantor para lhe questionar sobre a teoria dos conjuntos e encontrou Georg Cantor numa espécie de hospital psiquiátrico, pois não estava em seu pleno juízo. Quando Russell ao questioná-lo, viu que ele começou a falar coisas estranhas, sem muito sentido e soltou em uma de suas frases: "Jesus Cristo era na verdade filho de... José de Arimatéia!" [2]. Nos quadros seguintes mostra Russell abandonando o hospital, ainda abalado com o estado do matemático, mas a frase ficou na minha cabeça. Mais a frente, quando é publicado o paradoxo de Russell, uma enfermeia estava lendo-o para Georg Cantor, que explodiu num grito e chacoalhando a funcionária do hospital pelos ombros disse: "Finalmente sou um homem livre! Você não entende? O inglês provou que o 'Conjunto de todos os conjuntos' é uma impossibilidade! Meu monstro, o usurpador da grandeza absoluta de Deus não existe mais! Eu estou salvo..." [3] Interessante isso, não? O que gerava angústia naquele homem era pensar ter criado algo que iria contra a onipotência de Deus, e viu-se livre quando finalmente compreendeu o desfecho daquilo. Imediatamente pensei em alguns que questionam Deus se perguntando por que então Deus então não cria uma pedra que ele mesmo não consegue levantar?

Russell coloca então uma frase, que também fiquei pensando: "Dada uma certa quantia de irracionalidade, alguns podem ler religião até mesmo na lógica." [4] Apesar de seu ostracismo de uma vida religiosa, vê-se que preconceitos permeiam a mente de Russell, bem justificados com o que viveu da ignorância de sua família, e o que acontece com a maioria dos cientistas, que tentam afastar a ciência de Deus e Deus da ciência, e não percebem que tudo só faz sentido se colocados no mesmo plano.

Para finalizar, após ter terminado o volume dois de seu trabalho entitulado “The Foundations of Arithmetic”, Gottlob colocou um adendo no final, pois dobrou-se à publicação da obra, mesmo que abalada em suas fundações. O adendo diz que “Dificilmente alguma coisa mais infortúnia pode suceder para um escritor científico do que ter uma das fundações de seu edifício abalado após o trabalho estar terminado” e cita o trabalho de Bertrand Russell, que obteve o colapso de uma de suas leis. Colocar isso em seu livro foi um verdadeiro ato de honestidade intelectual, elogiado pelo próprio Russell em seu discurso de 4 de setembro de 1939, três dias após Hitler invadir a Polônia em seu Blitzkrieg.

_________
[1] - “Does the set of all sets which do not contain themselves contain itseft? If it does, then it doesn’t. And if it doesn’t, then it does!”

[2] - "Jesus Christ was in reality the son of… Joseph of Arimathea!"

[3] - “I’m a free man at last! Don’t you understand? The Englishman proved the ‘Set of all sets’ is an impossibility! My monster, the usurper of God’s Absolute Greatness thus no longer exists! I’m saved...”

[4] - “Given the right amount of irrationality, one can read religion even in Logic”

quarta-feira, 16 de junho de 2010

Bom Gosto

Estava lendo um artigo na revista Filosofia da editora Escala chamado “O Gosto dos Outros”, de Flávio Paranhos, o qual ele cita um filme que gosto muito chamado Sideways, e fala do bom gosto. Não só o bom gosto mas a mudança de gosto com a mudança de contexto. Logo me lembro de ter ficado horrorizado com um colega de trabalho ter comentado que não gostou do filme “O Livro de Eli”. Gosto é gosto, claro. Mas como pode não ter gostado desse filme? É aí que comecei a pensar no assunto. Nesse artigo da revista, Paranhos pergunta: “O que é o gosto? É possível gostar de algo ‘objetivamente’?”. Daí uma dúvida quanto à importância de uma crítica literária, de cinema, de vinho, etc. O que vale nesse aspecto é o gosto do cidadão e o que aquilo o remeteu no íntimo. E esse gosto muda, de acordo com o contexto. Um exemplo disso é pegar algum material ruim de seu autor preferido e lê-lo sem saber de quem se trata. Provavelmente você achará ruim, mas se souber que se trata do seu autor preferido, certamente olhará com outros olhos e sua crítica muda a partir daí. Gostei do filme “Cloverfield” porque é do J. J. Abrams, o qual gosto, mas pode ser que se o assistisse não sabendo disso acharia uma cópia barata de “A Bruxa de Blair”, por usar a mesma fórmula. Concordo com o artigo da revista que diz que somos todos arbitrários em nossas condenações e exaltações.

O problema disso tudo é a arrogância. Não gosto de Machado de Assis, embora seja leitor. Quando comento isso (que, aliás, evito), os que lêem clássicos me olham com total e mais absoluto desprezo. Como se fosse uma heresia monstro falar uma coisas dessas. Claro, para ele é, para mim não. Lembro-me de um amigo que toda vez que nos encontramos comenta do filme “O Cheiro do Ralo”, o qual, inocentemente, lhe recomendei e dei motivos para uma eterna brincadeira que sempre é feita quando digo que algo é bom. Ele odiou o filme, e eu gostei muito, e poderia dar uma centena de argumentos e não mudaria sua perspectiva ou opinião. “É ruim e ponto”, ele me disse. Por que será que gostei então? Fazemos parte de um grupo de amigos com mais ou menos a mesma estrutura cultural. Isso me fez pensar ainda mais no por quê de ter gostado daquele filme. Realmente é um filme diferente. Talvez por isso mesmo, por não esperar um final feliz ou uma obviedade que me fez gostar. Um outro amigo só gosta de filmes que tenham final feliz. Tem que dar tudo certo para ser bom. Eu já penso diferente. Se der tudo exatamente como planejado, qual o sentido de ficar até o fim assistindo? Se já sei como termina, para que perder todo esse tempo? Não que isso seja regra, pois gostei muito de “O Senhor dos Anéis”, mas foi por outros motivos e não especificamente o final.

E também pensei em outra coisa: Vale a pena ler uma crítica de um filme antes de assisti-lo? Você deixaria de comprar um jogo de vídeo game após as críticas ruins? Muitas pessoas, incluindo eu, são influenciadas pelo gosto dos outros. A crítica nada mais é que uma tentativa de racionalizar um gosto subjetivo. E assim como Paranhos descreve no artigo “Primeiro gostamos, depois racionalizamos. Primeiro subjetivamos, depois objetivamos. Primeiro inconscientes, depois conscientes.”. Só sei de uma coisa: Evito ao máximo indicar alguma coisa. Se o faço é porque alguém me pergunta diretamente. Não temos capacidade de entender o tipo de gosto de cada um e acertar todas as vezes. Chegamos perto, mas as vezes que erramos escutamos eternamente.